Conto dos Anjos

 Em um parquinho, com vários brinquedos recreativos, está uma menina sentada em um balanço. Ao seu lado, de pé em frente a um balanço vazio, está um garoto com um olhar firme e limpo. Ele segura com firmeza as correntes do balanço.
- Ei, você poderia me empurrar?
- Ah...sem problemas!
Ele sai de onde está e começa a empurrá-la devagarinho.
- Sabe...? A vida é estranha...
- Por que?
- Porque às vezes parece que todo o mundo te apóia e tem horas que todo mundo foi embora. Por que é assim?
- Veja bem...eu acho que é porque umas pessoas seriam felizes e outras não.
- Mas eu poderia ter ao menos alguém que goste de mim...eu não tenho ninguém que me am...
O garoto pára de balançá-la, segurando o balanço. Enquanto fala ele dá a volta e a encara.
- Não digas isto! Jamais repita! Esta é a maior mentira que alguém pode dizer a si mesmo. Há sempre alguém que ama alguém.
- Não parece...eu devo ser a exceção...
- Não, não é. E eu te provo. Eu até conheço uma história assim.
- Uma história? Oba! Me conte, adoro histórias.
- Feche os olhos. Imagine um mundo com castelos, fadas e heróis. Neste mundo há também gente má e triste. E uma destas pessoas era uma menina. Ela era muito triste. Era triste porque as pessoas não eram boas com ela. Naquele mundo havia também um anjo com asa quebrada.
- O que tinha ele? Por que tinha a asa quebrada?
- Ele as quebrou. As asas dele se transformaram em pétalas de flores. Porque ele quis presentear a menina que amava com elas. Ele amava a menina triste. E era a única forma deles se falarem. Ela não podia vê-lo, mas as flores, sim. E poderia sentí-lo através do mimo.
- E ele entregou as flores?
- Não, elas murcharam antes dele chegar até ela. Ele acabou por ficar só com uma asa. E sem mostrar que a amava.
- Nossa. O que aconteceu com ele depois?
- E então, ele arrancou a outra asa e doou a quem amava. Desta vez, a asa virou uma estrela e passou a morar no coração dela. Com isto, ela soube da existência dele. E eles podiam agora se encontrar nos sonhos dela.
- E a pessoa o que achou?
- Esta pessoa aceitou a estrelinha, e ficou muito tempo sem saber o que dar em troca.
- E a pessoa conseguiu dar algo em troca?
- No fim, ela percebeu que o que ele mais queria, ela sempre fora capaz de dar. Arrancou um pedaço do próprio coração e deu a ele.
- Com aquilo, o anjinho não mais era anjinho. Há muito ele não tinha asas. Não podia voltar aos céus.
- O que ele era?
- Ele tinha virado um garoto e podia amar a menina, porque eles se deram asas novas. Asas invisíveis feitas de amor.
- A menina deve ser feliz agora.
- O garoto pode sorrir todo dia por causa disto.
- Eles crescerão juntos?
- Estão crescendo, eles ainda têm medo do mundo, mas desde que deram as mãos, não temem mais nada.
- Nem o novo?
- O novo, eles saboreiam. O garoto carrega a menina quando ela tem medo de andar.
- Ele é gentil.
- A menina acalenta o garoto quando ele está cansado.
- Ela o ama né?
- Muito.
- E ele sabe que pode contar com ela quando ele mesmo perde as esperanças. Pois pode olhar bem dentro dos olhos dela.
- O que ele vê em seus olhos?
- Tudo
tudo que ele sonha
tudo que ela sonha
tudo que ele sente
tudo que ela sente
tudo que ele é
tudo que ela é
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André Ludovico